sexta-feira, 3 de janeiro de 2025

Asilo Político/Imunidade Consular – Considerações Com Casos Recentes

 Olavo Caiuby Bernardes

Em abril do ano passado, o México pediu que a Corte Internacional de Justiça - CIJ, tribunal vinculado à ONU, suspendesse o Equador da Organização, até o país pedisse desculpas por sua invasão à Embaixada do México em Quito.

No dia 05.04, a polícia equatoriana invadiu a embaixada do México em Quito, capital do Equador, e prendeu o ex-vice-presidente do país Jorge David Glas Espinel, acusado de corrupção em ramificações que envolvem a Operação Lava Jato, naquele país.

De acordo com notícias à época, em um comunicado à imprensa na data, o Ministério das Relações Exteriores do México anunciou que seu país havia decidido conceder asilo político a Jorge Glas, que serviu por quatro anos durante o governo de Rafael Correa – uma medida que a ministra das Relações Exteriores do Equador rapidamente criticou como “interferência nos assuntos internos”. Correa é aliado político do então Presidente do México, Andrés López Obrador.

Glas estava asilado na Embaixada do México desde dezembro. Desde a invasão à Embaixada, a relação entre os dois países está suspensa.

O asilo político, ato discricionário por parte do governo concedente, em razão de perseguição de ordem política, filosófica, religiosa, por autoridades do país de origem do asilado, divide-se em asilo territorial, concedido diretamente no território do país asilante, ou mais comum, consular (concedido na Embaixada, ou consulado do país que se pleiteia).

Para que o asilo consular seja efetivo, as autoridades do país onde se encontra a Embaixada, ou Consulado, devem conceder um salvo conduto para que o asilado saia do país. O caso lembra o do ex-fundador da Wikileaks Julian Assange, que solicitou asilo político na Embaixada do Equador em Londres, concedido então por Corrêa, em 2012 (e revogado anos depois, o que permitiu a prisão de Assange pela polícia britânica).

Referido exemplo se faz importante, visto que a representação diplomática de um país estrangeiro é inviolável e sua entrada sem a autorização pelas autoridades daquele país, que possuem imunidade no exercício de suas funções, é caso de violação a tratados internacionais, sobretudo a Convenção de Viena Sobre Relações Diplomáticas, de 1961.

A despeito de, ao contrário do que se popularmente imagina a Embaixada/Consulado de um país, não ser uma extensão de seu território, essa é dotada de inviabilidade e seus funcionários dotados de imunidade, conforme proteções trazidas em convenções diplomáticas.

Sendo assim, estão dotados Consulados e Embaixadas, de imunidade de jurisdição e no caso de Embaixadas, de imunidade de execução, o que lhes permite que não haja execução a seus bens pessoais, por dívidas de qualquer espécie.

Debate-se a extensão da qual embaixadas podem abrir mão da imunidade de seus funcionários, para que venham a ser processados por governos estrangeiros, pela chamada Cláusula Calvo, porém o fato é que enquanto não o fizerem, estes estão dotados de proteção até serem expulsos do país acreditante, no que é chamado a figura de persona non grata. No caso de piora da relação entre Estados Soberanos, seu Embaixador pode ser chamado para consulta e a Embaixada ficar sem representante, como já veio a ocorrer na relação entre Brasil e Israel, quando o atual governo de Luís Inácio da Lula Silva declarou que as ações do governo de Benjamin Netanyahu em Gaza, no atual conflito Israel-Hamas, configurariam um genocídio. 

No caso de piora de relação diplomática entre Estados Soberanos, essa pode levar ao drástico rompimento de relações diplomáticas, com o fechamento de Embaixada, como se viu mais recentemente entre Venezuela e Argentina, de Javier Milei, que não veio a reconhecer as controversas eleições de Nicolas Maduro. Ainda assim, documentos e a integridade de seus funcionários deve ser preservada.

Assim nesse sentido, enquanto a Embaixada/Representação Consular estiver em vigor sob hipótese alguma caberia uma invasão à uma embaixada por se discordar do asilo concedido a determinado indivíduo. 

O asilo político, a despeito de ser previsto em tratados e convenções internacionais, como a Convenção de Havana de 1928 (promulgada no Brasil pelo Decreto nº 18.956/1929), é ato discricionário de um Estado Soberano, a depender do momento na história daquele país. “One man’s terrorist is another man’s freedom fighter” (o terrorista de um homem é o combatente da liberdade de outro), como diriam os americanos). Sendo assim, durante o período militar, Leonel Brizola, político trabalhista cunhado do presidente deposto, João Goulart, por exemplo, conseguiu asilo político nos EUA do recém-falecido presidente Jimmy Carter, nos anos 70, notavelmente reconhecido por sua ênfase em direitos humanos. 

Ou seja, o asilo político, individualizado caso a caso, é ato soberano do Estado e se dá por razões de natureza de perseguição política. Solicitado no país de origem do pleiteante, ou no porto de entrada, pelo qual o pleiteante vier a entrar. Necessidade de comprovação de perseguição de natureza política, pelo Estado de origem, ou grupos/indivíduos vinculados àquele Estado e é prática longamente aceita no Brasil, prevista no artigo 4º, inciso X, Constituição Federal de 1988, de competência do Poder Executivo Federal, no caso processado pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública - MJSP.

Já o refúgio se aplica à coletividade de indivíduos, apesar de poder ser individualizado. Diversas espécies: refugiados de guerra, econômicos, por razões humanitárias, e/ou ambientais (nova classificação, ainda carente de proteção). Decorrente sobretudo de tratados e convenções internacionais (Exemplo: Convenção Sobre o Estatuto dos Refugiados de 1951).Em próximos artigos traremos sobre o refúgio e suas modalidades. 

https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/mexico-pede-que-equador-seja-suspenso-da-onu-por-invasao-a-embaixada-em-quito/ 

https://www.gov.br/mj/pt-br/assuntos/noticias/mjc-esclarece-principais-duvidas-sobre-refugio-asilo-politico-e-visto-humanitario

Olavo Caiuby Bernardes é advogado, professor e consultor. Bacharel em Direito pela PUC-SP (2009). Mestre/LLM em Direito Internacional (US and Transnational Law) pela Universidade de Miami (2011). Mestre em Ciência Política, com ênfase em Relações Internacionais, pela Universidade Federal do Pará (UFPA) (2016). Bolsista do CNPQ (2014 a 2015). Candidato ao Doutorado em Direito Internacional Público pela Universidade de São Paulo (USP) (2020). Membro da Comissão de Relações Internacionais da OAB/SP (triênio 2019 a 2022), da Comissão de Direito e Relações Internacionais da OAB Santos, da Comissão de Direito da OAB São Caetano do Sul e da Comissão de Soluções Pacíficas de Controvérsias da OAB-SP. Membro do Young Arbitration Group (Grupo de Jovens Árbitros) do Centro de Resolução de Conflitos da Universidade de São Paulo (CRC-USP). Especialista em Direito Internacional. Professor Universitário. Professor e tradutor de inglês jurídico.

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